segunda-feira, 13 de maio de 2013

Eu defendo a menor idade

Sempre que um adolescente pobre da periferia comete algum crime, ouve-se o "clamor popular" pela redução da maioridade penal. Comoção semelhante não é percebida quando um filho da classe média atropela e mata ao sair da balada com o carrão do papai, ou quando é flagrado com comprimidos de ecstasy que serão distribuídos em alguma festinha na zona sul. Esse é o espírito da nossa sociedade, tema para outra hora. Aqui, pretendo apenas apresentar meus argumentos contra a redução da maioridade penal.

1)É falsa a afirmativa de que os adolescentes não são punidos quando cometem ato infracional. O Estatuto da Criança e do Adolescente é mais rigoroso do que o Código Penal. Explico. O adolescente infrator é condenado por um juiz de primeira instância, sem qualquer perspectiva de recursos a outros tribunais e, na maioria das vezes, sem o acompanhamento de um advogado. De acordo com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, no final de 2010, havia 14.613 adolescelentes privados de liberdade (presos) no Brasil. Desses, 73% foram julgados na primeira instância, em sentença definitiva, sem possibilidade de recursos aos tribunais superiores. Os outros permaneceram recolhidos sem uma sentença judicial. Somente no Estado do Acre, havia 3.765 adolescentes privados de liberdade no período.

Entre 2011 e 2012, o número de internações cresceu 4,5%. Com a simples canetada de um juiz, o adolescente infrator pode ser condenado a três anos de prisão. Digo prisão porque, ao contrário do que estabelece o ECA, poucos Estados têm instituições adequadas para receber os jovens e iniciar um processo de reinserção social. A pesquisa da Secretaria de Direitos Humanos revelou que, em 2011, 680 adolescentes estavam cumprindo a medida de privação de liberdade em cadeias públicas, juntos com adultos criminosos, sem qualquer acompanhamento de profissionais preparados para o trabalho socioeducativo.

Quantos criminosos adultos cumprem três anos de prisão? Antes de tudo, é preciso saber quantos são presos. Segundo o Mapa da Violência, do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, apenas 8% dos homicídios são solucionados no Brasil. Entre os julgados, apenas 30% recebem uma pena maior que oito anos de prisão. Com todas as possibilidades de recursos e progressão de regime, é fácil concluir que os outros 70% dificilmente ficarão mais de 3 anos na cadeia. Ao contrário dos adolescentes.

2) Também é falsa a informação de que as punições no Brasil são mais brandas que em outros países. Uma pesquisa feita pelo UNICEF em 2007 traz uma radiografia da legislação aplicada em diferentes regiões e culturas. Dos 54 países pesquisados, 79% adotam a maioridade penal aos 18 anos. Entre eles, Alemanha, Chile, Costa Rica, Espanha, Finlândia, China, França e Holanda. Há casos como o do Japão, onde a maioridade é considerada apenas aos 21 anos. Na maioria dos países, a responsabilidade penal começa aos 14 anos. No Brasil, a legislação admite que os adolescentes sejam responsabilizados já aos 12 anos, inclusive com a restrição da liberdade.

3) Já temos uma legislação que pune suficientemente. Lutar contra a redução da maioridade penal não é defender a impunidade. Todas as pessoas que transgridem a lei, sejam adultos ou adolescentes, devem ser punidos. Precisamos apenas cumprir o que propõe a legislação. Quem imagina o endurecimento das penas como saída principal para a violência expõe ao risco a própria liberdade. Uma sociedade baseada no estado policialesco isola cada vez mais os indivíduos.

4) Precisamos de um marco civilizatório baseado no bom senso. Qual é a idade ideal para que uma criança ou um adolescente sejam punidos da mesma forma que um adulto? 16 anos? 10 anos? Qualquer idade? Há um raciocínio muito utilizado pelo senso comum: se uma pessoa pode votar aos 16 anos, também pode ser presa. Poderíamos levar o argumento ao extremo. Se uma criança de dois anos tem a capacidade de escolher entre um pote de sorvete e uma porção de brócolis deve ser responsabilizada pela obesidade que vai lhe trazer problemas na vida adulta? No processo de formação da pessoa, as experiências de cada fase são diferentes e ajudam a construir o caráter. Ninguém é intrinsecamente mau. Crianças e adolescentes se tornam íntegros a partir das relações que estabelecem entre si e com os adultos com quem convivem. Afirmar que não cedemos ao apelo fácil de endurecer a punição a crianças e adolescentes é crer em uma sociedade que prioriza a construção de relações saudáveis em vez de decretar a falência da civilização.

5) Eu prefiro a institução de uma menor idade. Parece mais fácil empreender esforços para mudar a lei e punir as pessoas cada vez mais cedo. De minha parte, acho mais saudável lutar para que a educação, a saúde, o amor,a liberdade e a justiça alcancem todas as crianças em uma idade cada vez menor.

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